Oba, Um Cara Morreu
Sob o olhar muçulmano de Sagar, as cerimônias funerais dos kalash mais pareciam uma festa - reunir as vilas, servir comida, tocar tambor, dançar.
Sob o olhar muçulmano de Sagar, as cerimônias funerais dos kalash mais pareciam uma festa - reunir as vilas, servir comida, tocar tambor, dançar.
Assim, quando, no jipe
a caminho de Chitral, ele soube que um senhor havia morrido, falou-me com
brilho nos olhos:
- Um cara morreu em
Bumburait.
Constrangido com a alegria
com que ele me dava a notícia e pela presença dos outros na carroceria do jipe,
inclusive de vários kalash, respondi timidamente:
- Poxa.
- Você sabe o que isso
significa, certo? – Seu tom de voz não disfarçava a exautação. Parecia, de fato,
que tomávamos conhecimento de uma festa.
- Sei. – Monossilábico.
- Nós vamos, não?
Funeral Kalash
Durante o período que passei nos vales Kalash, cerca de um mês, não me recordo de ter visto alguém triste. Pode-se esperar de um povo extremamente desapegado, tolerante e acostumado a uma vida árdua, que não se abata fácil. Entretanto, parece também haver um certo tabu com relação à tristeza, quase como se fosse vista como algo obsceno.
Assim quando alguém morre, lamenta-se a perda mas também celebra-se a vida. As pessoas cantam e dançam ao redor do corpo. Os tambores tocam lentamente enquanto as mulheres soltam um doloroso murmúrio e, abraçadas, balançam de um lado para o outro. O toque do tambor então acelera-se, os homens começam a gargalhar estrondosamente e os anciãos dançam erguendo bengalas como que desafiando a morte.
- Agora é tarde demais. Mesmo que você venha me buscar. - Parecem dizer com seu gesto. A vida plena e alegre que levaram, representa sua vitória sobre ela.
As outras vilas vêm juntar-se a cerimônia e a família mata umas tantas cabras para receber devidamente o povo.
Obviamente não torci pra ninguém falecer mas confesso que estava curioso. E aconteceu de um senhor falecer em Bumburait dando-me oportunidade de presenciar esse estranho velório.
No decorrer dos acontecimentos, muita gente aproxima-se do corpo para levar uma última prosa com o sujeito. Na minha opinião, um pouco tarde demais.
Resolvi de qualquer forma, fazer o mesmo. Aproximei-me, me apresentei e tive com o defunto o seguinte diálogo:
- Oi, meu nome é Bruno e venho do Brasil. - partindo do pressuposto que essas seriam suas primeiras perguntas - Não sei se seria adequado dizer "muito prazer", considerando as circunstâncias. Entretanto, embora esses costumes sejam completamente estranhos a minha cultura, acho tudo isso muito lindo e compreensível. Normal que a família sinta-se triste diante de uma saudade agora irremediável. Mas para mim, frente à morte, faz mais sentido celebrar a vida do que chorar sua inevitabilidade. Quem tem mesmo a lamentar são essas pobres cabras que hão de juntar-se a ti. Com licença, agora vou dançar...enquanto a Vida me permite.











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